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“Se eu deprimir, acumula a roupa suja”

Os gráficos divulgados para o Dia Internacional das Mulheres estão mais coloridos, mas pouco traduzem a realidade da mulher exausta

“Se eu deprimir, acumula a roupa suja e o bebê fica assado”. O desabafo de uma mãe, em plena idade produtiva, me foi dado em uma conversa corriqueira e gerou, de imediato, identificação. De tão cru, ainda é um pouco meu, com a exceção de eu não ter mais bebês sujeitos a assaduras.

Eu e ela já tentamos, vezes sem conta, compartilhar sobre o fardo da falta de salário no meio do mês, do desemprego, do assédio moral quando há trabalho, da inflação dos alimentos, da má qualidade do ensino, da solidão da maternidade, das opções de lazer indisponíveis a quem tem pouco dinheiro, da incompreensão de nossos chefes (eles e elas) quando nossos filhos adoeceram. Eu e ela já ouvimos, vezes sem conta (deles e delas), que a vida da mulher trabalhadora não tolera depressão e que deprimir é dar a impressão de pessoas preguiçosas. Exaustas, eu e ela seguimos.

Para ela, o Dia Internacional da Mulher é uma oportunidade de faturar um pouco mais com a procura pelos serviços de esteticista que oferece. Para mim, é a reta final de uma corrida por pautas, por dados, números e personagens, como impõe a rotina jornalística.

Para ela, o Dia Internacional da Mulher é uma oportunidade de faturar um pouco mais com a procura pelos serviços de esteticista que oferece. Para mim, é a reta final de uma corrida por pautas, por dados, números e personagens, como impõe a rotina jornalística.

Mentiria se dissesse que, agora apenas do meu ponto de vista, seria esse um dia como outro qualquer. Não é. Naqueles dados todos que estou obrigada a revisitar todos os anos, revejo ínfima mudança. Os gráficos ficam mais coloridos, chegam com designers envolventes e dizem as mesmas coisas: as mulheres continuam a ser violadas, desrespeitadas, ignoradas, mal pagas, anuladas. Compartilham de violências impostas sem a diferenciação de nação, idade, religião, nível educacional. E há a lógica da vulnerabilidade diretamente proporcional à pobreza. Ou seja, mais pobre, menos cidadã sujeita de direitos.

Foi assim quando comecei no jornalismo, há 30 anos, e permanece assim fora do colorido dos gráficos preparados por todo tipo de instituto de pesquisa. Os gráficos, as fórmulas e os percentuais  massificam e pouco traduzem o cotidiano (sempre odiei a frieza de cada um desses elementos). Na vida real, pela seletividade da data, seria como se essas figuras dissessem apenas todos os anos: “Poxa, não deu, né? Mas não fica triste, não, segue. No ano que vem tem mais”.

E assim seguimos, mulheres que não podem deprimir, deitar e descansar por estarmos cansadas, se recuperar das noites mal dormidas, chorar por termos de aceitar o assédio moral, pela inflação dos alimentos, pela violência imposta, pelo desemprego, pela falta de perspectiva, de saúde física e mental. Seguimos por não haver escolha, porque não podemos dar a impressão de que somos pessoas preguiçosas.

Sandra Luz é jornalista, formada pela UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), doutora em Ciências da Informação pela Universidade Fernando Pessoa (Porto, Portugal) e pós-doutoranda em História dos Direitos Humanos pela Universidade de Salamanca (Espanha).

Sandra Luz

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“Para destruir uma nação, você deve começar matando seus filhos.”

Adolf Eichmann, principal responsável pela implementação da “Solução Final” — o plano de exterminar os judeus durante a Segunda Guerra Mundial

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