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Atriz indígena trans estrela filme sobre o primeiro mártir da LGBTfobia no Brasil

Andria Quica, do povo Boe Bororo do Mato Grosso, será Tibira, uma figura histórica e símbolo da luta LGBQTIA+ no Brasil    

     O cinema nacional vem demonstrando fôlego após uma temporada adormecido “num tempo página infeliz da nossa história”, parafraseando Chico Buarque, e um dos maiores sinais de renascer com total vigor foi apresentado no longa “Ainda estou aqui”, Walter Salles, 2024, que emergiu num red carpet levando o Oscar de Melhor filme Internacional.

     De lá para cá, temos percebido quase um boom de produções nos mais diversos formatos, e, para ratificar esse momento, está na tela o festival de cinema do Rio, apresentado de 2 a 12 de outubro de 2025, na cidade do Rio de Janeiro.

     Diante de tantas produções nos mais variados sets de filmagens, existe uma rica realização rodada no Mato Grosso do Sul. Trata-se do curta-metragem “Hendy’a Repykwere”, sem tradução para o português, que tem como protagonista a indígena trans, Andrya Kiga, que conversou com Vila Morena.  

Vila Morena – Fale um pouco da sua história, dessa jornada e a história do seu povo Boe Bororo???

 Andrya Kiga – “Eu sou a ‘Andria Quica’, sou uma jovem indígena mulher trans em movimentos de aprendizagem. Acho que tudo o que eu vivi até hoje me fortaleceu para ser essa menina talentosa e dedicada a tudo o que eu faço. Tive o privilégio de ter uma infância que ajudou muito para eu ser essa pessoa muito social e expressiva no mundo de hoje e um privilégio de ter sido em um povo que, por muito tempo, é muito lindo, extraordinário, contemplador pela sua cosmologia de vida. Meu povo tem as metades exogâmicas norte e sul, contendo, na parte norte, 4 clãs e, na sul, quatro clãs, que possuem as suas pinturas, os seus adornos, os seus animais. Então tem essas riquezas de divisões lindas e sagradas. Ser uma mulher cerradeira é bem representar o seu bioma cerrado, é trazer as belezas do cerrado, ter um corpo que é o espírito do cerrado, as ancestralidades do cerrado, da mata da esfera de vida, que possui no cerrado em um corpo do ser mulher.

Bom, atualmente eu sou só universitária do curso de pedagogia, fazendo de forma EAD na Universidade Católica Dom Bosco do MS, em Campo Grande. Ainda não possuo formações, ainda só formação de vida espiritual da cosmologia do meu povo, sendo ensinada pela minha avó, minha bisavó, pelos anciãos da minha aldeia, que também são autores de saberes tradicionais originais de um povo, pois compreendemos que a cada povo indígena, como o meu povo Boe Bororo, possui política, educação e saúde em todo o seu contexto cosmológico de vida do determinado povo.

Vila Morena – Como foi conquistar esse lugar de mulher trans? Você foi questionada em algum momento dessa caminhada?

Na aldeia não tem muito a dizer da transfobia… eu sempre ganhei respeito do meu povo (Arquivo pessoal)

Andrya Kiga – “A minha relação com meu povo é de muito respeito, pois o meu povo entende que sou uma mulher e não questiona isso pelo físico, pois o meu povo é muito espiritual, então é carregado pelos seus ensinamentos e tem sentimento aos ensinamentos. Costumo dizer que, desde criança, o meu povo em espíritos me questionava por vir ao tempo já do povo sofrido com a colonização, de ficar se questionando por que um espírito feminino foi parar num corpo masculino, mas depois, com as aprendizagens, saberes do meu povo, entende que eu não era um erro e se conectar com a natureza, entender que ela não cria um ser sem o porquê. Bom, eu nunca precisei me pôr na aldeia como uma mulher trans. Meu povo, ele vem da mãe, ele é matrilinear. Todas as nossas divisões, tudo que a gente recebe na nossa cultura, vem das nossas mães. Então, quando eu me entendi como uma mulher, eu só falei para minha avó que eu queria deixar meu lado masculino e queria começar a aprender a praticar a fazer coisas que as mulheres faziam. E a minha avó, ela me recebeu de braços abertos por saber que, depois de vida que viesse por mim, teria suas divisões e eu queria raiz da minha família da minha mãe já tinha. Ela começou a me ensinar as coisas e eu fui ganhando respeito do meu povo nas práticas culturais e nos rituais culturais.”

Vila Morena – Sabemos da luta da comunidade LGBTQIA+ e que a luta da mulher trans/travesti ou homem trans é mais árdua devido ao peso do preconceito. Como foi para você se impor como mulher trans e indígena?

Andrya Kiga – “Eu já sofri, sim, transfobia no meu tempo. Antes de ir para o curso EAD, eu era do presencial. O meu corpo estava em transição, então já tinha muita característica feminina, mas ainda usava o banheiro masculino. Certo dia, teve um comentário na sala de um homem que começou a falar para as pessoas que eu estava olhando para ele. Aí, uma amiga minha escutou ele contando para os colegas e falou para tomar cuidado, porque, nas palavras dele, ele contava que, se eu olhasse para ele de novo, ele daria um tiro, alguma coisa assim. E eu acho que foi uma das mais pesadas que eu sofri na cidade.” Na aldeia não tem muito a dizer da transfobia pesada, porque eu sempre ganhei um respeito do meu povo, mas, algumas horas, a gente escuta lá algumas palavras transfóbicas, mas a gente está indo ensinando novamente, descolonizando o nosso povo, porque a colonização afetou muitas partes do povo.”   

Vila Morena – Você já sofreu transfobia? Há diferença entre cidade e aldeia? A mulher trans indígena sofre mais preconceito em relação às outras?

Andrya Kiga – “A diferença, sim, é entre a cidade e as comunidades indígenas, pois na cidade a comunidade indígena LGBTQIAPN+ sofre pela sua luta como uma pessoa indígena e também com a homofobia. Assim, também para mulheres trans, que só a transfobia é muito pesada na cidade, enquanto que na aldeia tem outra percepção pelos ensinamentos culturais do seu povo. Então há essa diferença, sim, de cidade e aldeia.”

Vila Morena – Explica um pouco sobre a importância da história de Tibira do Maranhão para a sociedade.

Andrya Kiga – “Da vida para Tybyra no curta-metragem foi um privilégio. Tybyra é uma referência de luta para mim, de resistência, de lutar por esse corpo livre, essa expressão livre de viver e te entender que o povo indígena é um corpo pertencente à mata da floresta, às águas, aos ventos, então tem essa liberdade livre e eu acho que também conhecer um pouco e saber mais da história de Tybyra é ver o caso de como os colonizadores chegaram devastando os povos indígenas, chegaram acabando com tudo e conhecer o primeiro caso de homofobia, transfobia, pois não sabemos o que o corpo de Tybyra era. Que era um corpo livre não padronizado em gêneros. O colonizador chegou matando essa liberdade de ser quem é que os povos originários tinham.”  

Vila Morena – Agora, quais são os planos de Andria Quica? Seguir na arte de interpretar ou no mundo acadêmico?

Andrya Kiga – “Desde criança eu aprendi que, quando a gente assobia, a gente chama os ventos. Então quero deixar os meus planos como o vento, esperando os assobios que sejam tanto no mundo da arte quanto no mundo acadêmico.”    

Uma produção inovadora e um marco para o cinema LGBTQIA+ indígena

     De acordo com o site Diversa, que busca informar, por meio do jornalismo, questões geralmente consideradas “tabus” pela sociedade, as filmagens do curta-metragem de nome Hendy’a Rapykwere, de aproximadamente 17 minutos, são um misto maduro e consciente que permitiu a criação de um documentário, ficção e realismo fantástico para dar corpo a uma história inédita no cinema brasileiro: a luta e a espiritualidade de jovens indígenas LGBTQIAPN+.

       Gravado em território de retomada na região de Douradina (MS) e na maior aldeia urbana do Brasil, Jaguapiru (Dourados – MS), o filme tem elenco 100% indígena e uma equipe técnica majoritariamente formada por pessoas negras, pardas e indígenas do interior do estado, reafirmando o compromisso com a representatividade e a inclusão em todas as etapas do processo criativo.

     O curta faz emergir a figura de Tybyra do Maranhão, indígena Tupinambá executado brutalmente em 1614, considerado o primeiro assassinato de pessoa LGBTQIAPN+ das Américas. Sua memória, por séculos silenciada, ressurge agora no cinema como símbolo de resistência e guia espiritual. Interpretada pela atriz trans indígena Andrya Kiga, do povo Bororo (MT), Tybyra aparece como presença mítica, trazendo ao protagonista e ao público a lembrança de que as lutas de hoje têm raízes profundas na história. (politicadiversa.com.br/2025)

Primeiro caso de morte por homofobia documentado no Brasil no século XVII

     Segundo o site da BBC News Brasil, em 1614, um índio tupinambá foi executado, com a anuência de religiosos da Igreja Católica em missão no Brasil, por conta de sua orientação sexual. Conhecido como Tibira do Maranhão — tibira é um termo utilizado por indígenas para se referir a um homossexual —, seu caso é o primeiro registro de morte por homofobia no Brasil. Ativistas LGBTQIA+ querem que o personagem seja reconhecido como mártir e fazem campanha para divulgar a história.

   As publicações que trazem a história de Tibira do Maranhão até os dias atuais, como o caso do site da BBC News Brasil, só foram possíveis porque o professor universitário, sociólogo e antropólogo Luiz Mott, da Universidade Federal da Bahia e fundador da organização não-governamental Grupo Gay da Bahia, quando há seis anos atrás publicou uma obra chamada São Tibira do Maranhão — Índio Gay Mártir, com o relato da execução do personagem histórico. Um caso que revela os primórdios da LGBTfobia por meio do eurocentrismo que ainda hoje persiste nas sociedades latinas, principalmente.

     Após todos os levantamentos sobre o indígena, o professor Luiz Mott apresentou registros da vida de Tibira do Maranhão, e uma das suas dores está no seu assassinato por homofobia, termo que, na época, século XVII, em um Brasil dominado por europeus, e eliminar indígenas era algo frequente, e eliminar um indígena que tinha comportamento e características femininas, apesar de ser, aos olhos dos colonizadores, uma pessoa masculina.

   O preconceito da época matou Tibira sem piedade, como ocorre ainda hoje no Brasil, principalmente em pleno século XXI

“Uma pessoa amarrada à boca de um canhão como pena de morte por ser homossexual. A execução dividiu o corpo em duas partes. Essa história de terror, invisibilizada ao longo dos séculos, ocorreu no Maranhão, em 1613 ou 1614, nesse que pode ser o primeiro caso de assassinato por causa da homofobia no país. Segundo o antropólogo Luiz Mott, recuperar os detalhes do que ocorreu e garantir divulgação ao caso é importante não apenas para reconhecer o esquecimento do passado, mas também para se indignar com a atualidade. O assassinato, ocorrido no século 17, é um caso, portanto, que estaria próximo de completar 410 anos. A vítima foi um indígena tibira (termo genérico tupinambá alusivo à homossexualidade). Ele foi acusado de “sodomia”, um pecado aos olhos do fundamentalismo e da intolerância homofóbica por parte dos missionários franceses no Maranhão.”

Helio Tinoco

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